O Conselho Regional de Enfermagem do Estado (Coren-RN) fez uma denúncia de sobrecarga no fluxo do Hospital Maternidade Araken Irerê Pinto após a transferência de serviços para a unidade em razão do fechamento do Hospital Pediátrico Nivaldo Júnior, no mês passado. O Coren e o Sindsaúde afirmam que a transferência para a Araken provocou um desarranjo de fluxo, o que resultou, principalmente, em sobrecarga de trabalho.
De acordo com o presidente do Coren no Rio Grande do Norte, Manoel Egídio, uma visita de fiscalização ao hospital maternidade identificou as complicações do fluxo de trabalho e impactos nos leitos com a chegada dos pacientes do Nivaldo Júnior. “Isso tem causado sobrecarga no pronto-socorro. A gente entende que falta uma definição de um fluxo mais eficiente para isso e para a questão de pessoal, porque houve alguns distratos contratuais com o fechamento do Nivaldo”, diz o presidente do Coren-RN.
Juntamente com o Sindsaúde, o Coren está fazendo um levantamento sobre o déficit de profissionais na Araken. O estudo será entregue ao Ministério Público. “Estamos cobrando a escala da gerência da unidade hospitalar para fazer esse levantamento”, afirmou Manoel Egídio, do Conselho. A Secretaria Municipal de Saúde (SMS/Natal) não se pronunciou sobre o assunto.
De acordo com Érica Galvão, diretora do Sindsaúde, os problemas no Hospital Maternidade Araken Irerê Pinto se aprofundaram com a chegada da demanda do Hospital Nivaldo Júnior. Há acúmulo de serviços, problemas de infecção cruzada e um cenário caótico por falta de mão de obra”, denuncia.
Segundo Galvão, a unidade comporta hoje um pronto-socorro obstétrico, uma maternidade para partos de média e alta complexidade, maternidade clínica (onde ficam as parturientes), pronto socorro ortopédico (herdado do antigo Hospital Municipal), além de internação clínica pediátrica de baixa, média e alta complexidade. A alta demanda, afirma, respinga em outro problema: a falta de mão de obra.
“A gente ainda não tem dados sobre o déficit de profissionais, porque estamos fazendo o levantamento. De forma incipiente, a gente sabe que tem técnico de enfermagem que fica com até oito pacientes por plantão. O ideal, de acordo com uma resolução do Cofen [Conselho Federal de Enfermagem] é que o técnico fique com dois pacientes [por plantão]”, explica Érica Galvão.
Segundo ela, são apenas três técnicos de enfermagem por expediente. Os enfermeiros também sofrem com a alta demanda no hospital maternidade, conforme aponta a diretora do Sindsaúde. “O enfermeiro pode assumir até quatro pacientes, segundo resolução do Cofen, mas na Araken trabalha com até 10 pacientes por plantão. Esses números estão muito acima do índice de segurança técnico. Sem contar que faltam fisioterapeutas, assistente social e nutricionista”, afirma.
A diretora do Sinsaúde defende que os aprovados no concurso realizado pelo Município em 2018 sejam chamados para compor o quadro de funcionários da unidade. “O concurso tem validade até 2024. Chamar esse pessoal iria melhorar a situação”, declara. Procurada, a SMS/Natal, informou apenas “que os aprovados estão sendo chamados”.
Érica ressalta que hoje o hospital maternidade é uma união de duas outras: o Hospital Nivaldo Júnior e o Hospital Municipal. “Com a junção dessas unidades, a situação foi se precarizando. É importante salientar que o serviço de pediatria, embora semelhante, não é o mesmo que o serviço de maternidade. Então, nosso fluxo ficou todo bagunçado”, diz.
A TRIBUNA DO NORTE conversou com uma funcionária do hospital maternidade na condição de anonimato. Segundo a profissional, no último plantão, há dois dias, o pronto-atendimento da maternidade estava lotado. “Antes do Nivaldo vir para cá, nosso fluxo era organizado. No primeiro andar tínhamos o alojamento conjunto (onde ficavam as mães com os bebês após o parto e os tratamentos clínicos) e no segundo a sala de parto e o pronto-atendimento”, conta.
“Depois, com a chegada dos pacientes do Nivaldo, veio o setor pediátrico e ocupou o primeiro andar, onde era o alojamento. Com isso, foram desativados cerca de 20 leitos e tudo ficou concentrado no pronto-atendimento e na sala de parto. O número de leitos diminuiu e o fluxo aumentou. Às vezes, as mulheres em trabalho de parto ficam nas poltronas, no pronto-atendimento mesmo. Quando não tem vaga em lugar nenhum, algumas puérperas que passaram por cirurgia são encaminhadas ao setor pediátrico, o que é proibido. No meu último plantão, chegou ao ponto de que não havia mais leitos para as pacientes sequer sentarem”, desabafa a profissional.
Além das altas demandas e do baixo quadro de funcionários, o Sindsaúde denuncia que o antigo necrotério utilizado para receber corpos de vítimas de covid-19 foi reformado e inaugurado como refeitório no último dia 3.
“Nós ficamos horrorizados. Ali se depositavam de 15 a 20 corpos por dia na época da pandemia e os enfermeiros estavam diretamente naquele espaço, fotografando os mortos para que as famílias fizessem o reconhecimento. A Prefeitura agiu como se nós não tivéssemos memória de tudo o que ocorreu ali”, desabafa Érica Galvão, do Sindsaúde, que também trabalha na unidade.
A TRIBUNA DO NORTE procurou a Secretaria Municipal de Saúde de Natal para que comentasse as denúncias feitas, mas a pasta não respondeu aos contatos da reportagem até o fechamento desta edição.
Tribuna do Norte