Insegurança assola centro de Natal: “Cidade Alta é terra de ninguém”

“Quase todas as noites eu escuto as pancadas dos pés-de-cabra e martelos arrombando as portas”. Esse é o relato do morador da Cidade Alta e comerciante Abimael Silva, 60 anos, proprietário do Sebo Vermelho, que está há quase 50 anos na região. O sebista, que também é um dos maiores publicadores de livros do RN, testemunhou os momentos de ascensão e o declínio do bairro, que um dia foi um dos mais movimentados de Natal.

Para Abimael, a insegurança crescente e a falta de investimento do poder público são os principais fatores que contribuem para o cenário de abandono. “A questão é que três agravantes que fazem com que a Cidade Alta fique nessa decadência é a falta de investimento do poder público, a insegurança e a falta de estacionamento. Esse tripé que é o agravante”, disse.

Abimael afirma que muitos colegas de trabalho já foram assaltados e desistiram de prosseguir com o comércio no bairro. Ele lembra que a Polícia Militar tinha uma base de patrulhamento, que hoje não existe mais, o que pode contribuir para o aumento da sensação de insegurança.

“Todas essas lojas aqui já foram assaltadas. Aqui, a loja ao lado tinha uma escola de gastronomia. Fechou há três meses. Tentou abrir, mas foi assaltada umas cinco vezes. Quando a pessoa estava se preparando para inaugurar, os ladrões levaram tudo. A pessoa ficou arrasada. Tentou se recuperar, mas foi assaltada novamente e fechou”, contou Abimael.

“Daqui a 20 anos, Cidade Alta vai estar pior que a Ribeira”

De acordo com Abimael, apesar do cenário de degradação recente, o declínio na atividade comercial começou a ser percebido desde os anos 90, quando grandes lojas e outros empreendimentos começaram a migrar para a Zona Sul da cidade. “Acho que desde o começo dos anos 1990 que a Cidade começou a descer a ladeira. Por quê? Porque começou a sair as grandes lojas, as grandes redes, os cinemas, os bancos, tudo. Todas foram em direção à Zona Sul, aos shoppings. Daqui a 20 anos, a Cidade Alta vai estar pior do que a Ribeira”, pontuou Abimael.

O sebista lembra que nos anos 1980 muitos empresários disputavam o aluguel de lojas no centro da Cidade, mas atualmente a realidade é outra. “Chegava aqui empresários dizendo que queriam lojas e pagavam o valor de ‘luvas’. Mas hoje a oferta é tão exorbitante que, no barato, tem 50 prédios aqui para alugar, vender ou trocar, só deste lado da avenida Rio Branco. Ou seja, na rua principal do bairro, ter essa quantidade de casas e lojas fechadas é uma coisa muito grave”.

O comerciante acredita que o bairro ainda tem como reverter o quadro atual, mas vai precisar do auxílio do poder público. Umas das soluções, segundo ele, seria a isenção do IPTU por um determinado tempo para que a Cidade Alta possa começar a se reestruturar. “O poder público tem que fazer sua parte. Tem que chamar os comerciantes e dizer: está com o prédio fechado? Eu vou lhe dar uma isenção do IPTU durante 10 anos. Fazer acordos para dar vida. Quando o poder público fizer isso aí, já vai ser um incentivo”.

“Eu nunca achei que o centro da Cidade iria acabar”

Ivani Ferreira, 61 anos, que está trabalhando desde 1981 em uma cigarreira na avenida Rio Branco, próximo ao IFRN, afirmou que o movimento está tão fraco que consegue vender pouco até chicletes, chocolates e água. “Cada vez mais está caindo. Só fechando lojas e demitindo funcionários. Está ficando muito difícil. Aqui no meu ponto, as coisas estão quase parando. Eu nunca achei que o centro da Cidade iria acabar assim, de repente. Eu não esperava isso. Agora, está cada vez mais difícil”.

Mas ele ainda acredita na reversão da situação, caso o poder público consiga agir a tempo: “Dependendo do poder público, acho que tem jeito. Se abrissem mais lojas, como a C&A, algum prédio da Prefeitura”. Já Luiz Diógenes, 61, que é vendedor de bolsas há 37 anos na Cidade Alta, disse que está de malas fechadas para se mudar e vender seus produtos no interior do estado. Segundo ele, a situação atual é insustentável para os comerciantes locais. “Estou ajeitando as coisas para ir para o interior vender. O comércio aqui acabou. Vou para Lajes”.

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