Com o passar dos anos, o movimento vegano tem ganhado força. No Brasil, em 2018, segundo o Ibope, 14% da população se declarava vegetariana. Em 2021, de acordo com pesquisa do Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec), 46% dos brasileiros deixaram de comer carne ao menos uma vez por semana. Com o crescimento do público, há a abertura de negócios direcionados, como bares e restaurantes. Em levantamento da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), existem cerca de 240 restaurantes vegetarianos e veganos no País e mais de 3 mil estabelecimentos oferecem a opção no cardápio. Pensando no crescente número de adeptos, empreendedores potiguares enxergam o nichocomo promissor.
E foi observando esse crescimento e a falta de locais especializados em Natal qu 35 anos, resolveu empreender. De acordo com ela, o mercado está em constante avanço, o que abre espaço para novos empreendimentos. “Creio que o mercado vegano não só em Natal mais em todo o planeta ta em expansão. Creio que devido à conscientização sobre a possibilidade de uma vida mais sustentável”, disse.
Para o mercado global, não só no setor alimentício, como também de cosméticos, roupas, calçados e afins, o aumento indica também retorno financeiro para os próximos anos. De acordo com estudo da Allied Market Research, o mercado vegano foi avaliado em USD$ 19,7 bilhões em 2020 e a expectativa é que cresça para mais de USD$ 36,3 bilhões até 2030.
Há seis anos Flávia Duarte abriu o Goodala Burguer, um espaço especializado em comida vegana, que cumpre ainda uma agenda cultural. “O Goodala surgiu de duas necessidades na época. Uma foi a busca por empreender e a outra foi pela falta de lugares veganos para sair e comer”, conta. Com o tempo, o lugar cresceu a atraiu não só pessoas com o mesmo estilo de vida, como também curiosos.
“A princípio, chegaram as pessoas veganas e vegetarianas e, depois, os curiosos. Meses foram se passando e foi caindo na boca do povo. Então apareceu outras demandas. Demandas de pessoas com restrições alimentares, pessoas que optaram por uma alimentação mais saudável. O negócio foi ganhando um corpo e após o segundo ano aumentamos a nossa loja”, completa a empresária.
O veganismo é uma estilo de vida ligado a proteção dos animais. Por isso, os adeptos da causa passam a consumir apenas alimentos de origem vegetal ou produtos que não sejam testados em animais, como maneira de lutar contra a crueldade animal. A mudança na alimentação também pode ser motivada por questões de saúde, como intolerâncias e apelo ambiental. Já vegetarianos são pessoas que ainda consomem alimentos como leite e ovos.
Assim como Flávia, o pernambucano Francisco Filho, 60 anos, enxergou na capital potiguar uma forma de fazer negócio dentro do vegetarianismo, base de onde se ramifica o veganismo. Em 2007, ele abriu o Viver Melhor, um restaurante baseado em alimentos de origem natural e saudáveis. Todos dos dias são 16 pratos, sendo 15 deles veganos e apenas um com um alimento de origem animal, destinados àqueles que ainda têm uma dieta mais flexível.
Enquanto não havia quase nenhum outro lugar com essa proposta na cidade, Francisco aproveitou o espaço. “Aqui praticamente só tinha um e a gente viu que precisava desse trabalho aqui, uma divulgação maior, uma proposta melhor”, conta. Ele abriu o local também na intenção de disseminar um novo estilo de vida, que o livrou de diversas doenças quando era mais novo. “Aqui é lugar ideial, as pessoas precisam, mas não tinha alternativa. Por isso a gente viu e deu certo”, disse. Atualmente, o restaurante funciona no Mercado de Petrópolis no estilo self-service.
O local conta com o engajamento de toda a família, oferecendo uma comida caseira, sem adição de ingredientes industrializados. Moqueca de caju, moqueca de banana, quiche, farofa de cenoura, são alguns dos pratos criados pela sua filha, Dâmaris Ellen, 34 anos, e esposa, Antelúcia de Oliveira, 60 anos. “Minha esposa e minha filha são muito criativas. É tanto que a gente cresce a cada dia”, completa.
Natalense entrega sopa vegana na rua
Com o pensamento em ajudar pessoas em situação de rua, o cozinheiro Charlie Chanco começou a entregar sopa vegana em Natal. O projeto Sopa Vegan nasceu há cerca de cinco anos e hoje conta com a ajuda de amigos. Ele já foi dependente químico e pessoa em situação de rua. Por isso, a iniciativa visa ajudar àqueles que mais precisam. De acordo com ele, o veganismo o ajudou a superar as principais dificuldades. “Radicalmente mudei, parei de usar drogas, busquei o veganismo e aprendi a cozinhar na doida”, relata.
A princípio, as pessoas estranharam o nome, mas se acostumaram e hoje, para alguns, é uma das poucas formas de alimentação. “A primeira vez as pessoas não sabiam o que era vegano”, conta. A entrega é feita três vezes na semana na região do Viaduto do Baldo, em frente ao Teatro Alberto Maranhão, na Ribeira e próximo a sede da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (STTU). “São locais com pessoas em situação de vulnerabilidade social”, comenta. Além da sopa, também são entregues itens de higiene pessoal para as mulheres.
Preços altos dificultam a compra de alimentos veganos
Ainda existe uma discussão sobre o preço dos produtos plant-based (a base de plantas, em tradução livre). Segundo levantamento da SBV, o principal motivo da não compra de alimentos desse tipo está relacionado diretamente ao alto preço, segundo 59% dos entrevistados. A pesquisa não foi feita apenas do Brasil, mas em toda a América Latina. De acordo com a nutricionista e professora de padrão vegetariano, Michelly Kytchia, é possível adquirir alimentos com preços acessíveis a partir da valorização do comércio local.
Comer frutas da estação, aproveitar a maior parte, senão todas as partes de um alimento, enquanto inova em receitas é uma possibilidade para gastar menos. “Não precisamos ir longe. Precisamos incentivar o comércio local, as frutas que a gente tem na região, os alimentos que nós temos. Fazendo tudo isso, alimentamos o comércio local, nutrimos as pessoas e favorecemos saúde e vitalidade”, indica a nutricionista.
Ainda de acordo com a nutricionista, uma dieta simples já é suficiente para garantir a boa nutrição de uma pessoa vegana e é um mito a afirmação de que essas pessoas são mal nutridas. Arroz, feijão, frutas facilmente encontradas como manga, e leguminosas como soja, lentilha, grão-de-bico e ervilha já contribuem. Semente de jerimum também é uma forma de encontrar proteínas fundamentais, inclusive, no ganho de massa muscular.
O mesmo é repercutido pela estudante de ecologia, Amanda Oliveira, 23 anos. De acordo com ela, o consumo de alimentos industrializados, mesmo que à base de plantas, além de ser prejudicial a saúde, encarece as compras. “Se você for uma pessoa que compra industrializados e ultraprocessados que as indústrias te oferecem é caríssimo. Se fizer em casa sem apoiar o comércio vegano local, alguém que faz e vende não vai, e ainda vai ser sem químicos”, complementa.
A estudante fez a transição para o veganismo estrito em 2017, enquanto era ovo-lacto-vegetariana, ou seja, consumia laticínios e ovos. Depois que fez a transição, passou a entender o veganismo como um movimento que busca a justiça social, o apoio a causa animal, bem como o consumo de alimentos acessíveis e facilmente encontrados em feiras e empreendimentos locais.
O veganismo é uma ramificação do vegetarianismo, que ainda conta com outras ramificações. Existem os ovolactovegetarianos, pessoas que retiraram a carne da rotina alimentar, mas consomem leite e ovos, bem como seus derivados; lactovegetarianos são aqueles que excluem ovos e carnes mas continuam consumindo laticínios; flextarianos são aqueles que consomem carnes em alguns dias na semana, ou seja, tem uma dieta flexível.
Fonte: Tribuna do Norte